Desde a Antiguidade os problemas
da origem da vida e dos seres vivos preocupam o ser humano.
Mesmos filósofos importantes, como
Platão e Aristóteles, aceitavam tal explicação sobre a origem dos seres vivos.
Dessa interpretação surgiu a teoria da
geração espontânea ou teoria da
abiogênese, segundo a qual todos os seres vivos originam-se da matéria bruta
de modo contínuo. Essa teoria, entretanto, foi contestada por vários
cientistas, que através de seus experimentos provaram que um ser vivo só
origina de outro ser vivo. Surgiu, então, a atualmente aceita teoria da biogênese.
Teoria da
Abiogênese: Os seres vivos originam-se da matéria bruta de maneira
contínua.
Teoria da
Biogênese: Os seres vivos originam-se de outros seres vivos
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Uma
Abordagem histórica
Em trecho de seu livro A origem das espécies, publicado em
1859, Charles Darwin afirma que diferentemente
da crença geral, as espécies não são estáticas e imutáveis, mas se alteram
durante longos períodos de tempo. Quando afirma que as espécies evoluem a
partir de outras, preexistentes, Darwin lança uma pergunta para o passado: e os
primeiros seres vivos, que não tinham ancestrais dos quais podiam originar-se?
As idéias darwinistas sobre a
evolução antecederam em mais de meio século a publicação da obra A origem da vida, de Oparin, em que o
genial bioquímico russo expõe suas idéias a respeito do surgimento dos seres
vivos como uma evolução lenta e gradual a partir de sistemas inorgânicos.
Um painel do desenvolvimento das
hipóteses sobre o aparecimento da vida na Terra nos ajudará a perceber como o
conhecimento, da mesma forma que os seres vivos, também evoluem. Existem
algumas semelhanças entre o pensamento de Oparin, que fala de fatores
abióticos, e a Abiogênese.
De
Aristóteles a Pasteur – A vitória do método científico
Há mais de 2.000 anos, Aristóteles
lançou postulados que nortearam por muito tempo diversas áreas do conhecimento.
Suas idéias sobre a origem da vida, por exemplo, baseavam-se na existência de
um princípio ativo (ou princípio
vital), capaz de produzir matéria viva a partir de matéria bruta, quando em
condições favoráveis. Não era, segundo Aristóteles, algo concreto mais uma
“capacidade de fazer” que organizaria de tal forma uma sequência de eventos,
aponto de culminar com o aparecimento de um ser vivo. Tal hipótese – conhecida
como abiogênese ou geração espontânea – só foi
definitivamente abandonada no século XIX.
Hoje certas afirmações podem
parecer estranhas; contudo até “receitas” para a fabricação de animais foram
propostas. O médico belga Jean Baptiste Van Helmont, grande biólogo e
pesquisador de fisiologia vegetal, ensinava a produzir camundongos a partir de
uma camisa suja, guardada com grãos de trigo em um local tranquilo, para que pudesse sofrer a ação do princípio ativo.
BATISTE VAN HELMONT
Com certeza, Van Helmont fez essa
experiência. Faltou a ele conhecimento sobre método científico, que obrigaria
controlar melhor suas investigações, colocando uma camisa em um lugar aberto e
outra dentro de uma caixa fechada. Seguramente os resultados teriam sido
diferentes! Todavia, para o pensamento dominante da época, a geração espontânea
era algo tão evidente que não tinha de ser testado. Isso ilustra uma questão
relacionada aos trabalhos científicos: os preconceitos e as suposições dos
cientistas a respeito dos assuntos sobre o qual estão investigando podem
influenciar o método de execução dos experimentos e sua interpretação.
Em 1668 o médico e biólogo
Florentino Francesco Redi iniciou, pacientemente, a contestação da abiogênese.
Trabalhando com a origem dos insetos, ele colocava pedaços de peixe ou carne em
frascos abertos e observava que em alguns dias surgiam larvas em grande
quantidade. Experimentou colocar os peixes em frascos e fechá-los, e as larvas
não apareciam, mesmo depois de o peixe ter apodrecido. Outra constatação
importante foi que, quando as larvas capturadas se desenvolviam, originavam
moscas semelhantes ‘as que ele via voando sobre os frascos.

Os defensores da geração espontânea contestaram, dizendo que as larvas não se formaram porque, no frasco fechado, não havia a entrada de ar. Redi cobriu os frascos com gaze e ainda assim não surgiram larvas. Os trabalhos de Redi apontavam para a idéia de que só havia vida a partir de outra antecessora, e essa foi a base da teoria da biogênese.
Apesar de bem conduzidos, os
experimento de Redi não conseguiram derrubar uma idéia arraigada por tantos
séculos. René Descartes e Isaac Newton – dois dos maiores pensadores de todos
os tempos – foram alguns ilustres defensores da abiogênese.
Às vezes avanços tecnológicos
reforçam ideias falsas. Isso ocorreu com a invenção do microscópio: quando os
pesquisadores viram, em uma gota de água, uma grande quantidade de seres
minúsculos, os acharam muito insignificantes para que pudessem reproduzir-se.
Julgaram que só poderiam aumentar de número por geração espontânea!

Colocou caldos nutritivos em
frascos de vidro e aqueceu-os; poucos minutos depois, fechou-os com rolhas de
cortiça e voltou a aquecê-los. Após
algum tempo, verificou a presença de microorganismos nos caldos, afirmando
terem surgido por geração espontânea.
Em 1776 o padre e biólogo italiano
Lazzaro Spallanzani repetiu as experiências de Needham, tendo o cuidado de
ferver por uma hora os caldos nutritivos antes de fechar hermeticamente os
frascos.
Acreditava que os microorganismos
encontrados pelo pesquisador inglês haviam aparecido porque o tempo de
aquecimento não fora suficiente para destruir os germes preexistentes nos
caldos. Depois de vários dias, os seus caldos nutritivos continuavam livres de
germes.
Houve forte objeção aos resultados
de Spallanzani, principalmente por parte dos seguidores de Needham. Eles diziam
que Spallanzani havia “torturado” os caldos nutritivos, aquecendo-os a uma
temperatura alta por tanto tempo que destruíra o princípio ativo, e que seus
frascos fechados impediam a entrada de ar, essencial para a geração espontânea.
É fácil imaginar como deve ter ficado o humor do bom padre...
Mudanças em conceitos antigos são
lentas. A contestação apresentada por Needham foi suficiente para derrubar os
resultados convincentes (pelo menos para nós) dos trabalhos de Spallanzani.

Em
1862 Pasteur elaborou uma engenhosa experiência, em que diversos líquidos
nutritivos eram colocados em frascos de vidro. Aquecia os gargalos de alguns
frascos, tornando-os maleáveis, e os curvava (frascos de pescoço de cisne).
Outros frascos permaneciam com o gargalo curto e reto. A seguir, fervia durante
alguns minutos os caldos nutritivos. Nos frascos de pescoço reto, havia rápida
contaminação do líquido nutritivo; nos frascos
de pescoço de cisne, mesmo depois de meses, as soluções permaneciam
claras e sem germes.
Como os frascos ficavam abertos,
não se podia falar da impossibilidade de entrada do princípio ativo. Com a
curvatura do gargalo, os microorganismos do ar ficavam retidos na superfície
interna úmida e não alcançavam a solução nutritiva.
Pasteur observou que, quando partia o longo pescoço de um frasco. Em um ou dois dias o caldo era invadido por bactérias e fungos, exatamente como nos frascos mantidos com o gargalo reto. Isso também acontecia quando o frasco era inclinado, de modo que o líquido entrasse em contato com a poeira acumulada na curvatura.
Simples e completa, essa experiência não permitiu
contra-argumentação: não permitia a entrada do eventual princípio ativo, pois
mantinha os frascos abertos; preservava, nos caldos nutritivos, a capacidade de
desenvolver vida, o que acontecia quando os frascos eram quebrados ou
inclinados.
Pasteur foi contemplado com o prêmio da
Academia de Ciências. A partir de então, os críticos da biogênese calaram-se.