domingo, 4 de dezembro de 2016

Cientistas brasileiros ajudam a entender como é regulado o crescimento dos neurônios

A área das Neurociências acaba de receber uma importante contribuição de uma equipe de pesquisadores, dentre os quais se incluem cientistas brasileiros. Desenvolvido na Universidade de Cambridge em projeto apoiado pela Agência Fapesp, o estudo foi divulgado na revista científica Nature Neuroscience, trazendo novas informações sobre os fatores que interferem no crescimento dos neurônios, mais especificamente nas ramificações em axônios, responsáveis pela transmissão dos impulsos nervosos.
Talvez você esteja se perguntando PARA QUÊ serve esse tipo de conhecimento, certo? Pense, por exemplo, num circuito elétrico de uma lâmpada florescente. Do que depende o funcionamento correto dela? Ora, depende que o fio que conduz a corrente elétrica esteja conectado nos lugares certos, possibilitando que a lâmpada responda ao estímulo gerado pela mudança de posição do interruptor. Pois é, algo muito similar acontece na transmissão dos impulsos nervosos. Eles viajam por essas ramificações dos neurônios de um ponto a outro do corpo humano, transmitindo informações que, para nós, manifestam-se na forma de sentidos. Mas, para isso, é preciso que essas ramificações estejam conectadas nos lugares certos.  Logo, descobrir o que faz com que um axônio “escolha” um caminho em detrimento de outro pode contribuir significativamente no tratamento de doenças do sistema nervoso. “Se conseguirmos entender melhor esse mecanismo, talvez seja possível encontrar meios de modular o crescimento e a regeneração neuronal, contribuindo, por exemplo, para o tratamento de lesões na medula espinhal e doenças neurodegenerativas”explica Kristian Firenze, coordenador da pesquisa.
Embora os axônios se ramifiquem, à princípio, em todas as direções, a continuidade desse crescimento não se dá à esmo. Fazendo uma comparação didática, é sabido que nem mesmo os ramos de uma árvore crescem dessa forma. Antes, eles sofrem a influência de diversos fatores, como a incidência de luz, por exemplo. Da mesma maneira, sabia-se até então que sinalizadores químicos atuavam no direcionamento dos axônios, garantindo que as conexões neurais fossem bem sucedidas.  Agora, um novo dado é acrescentado às Neurociências. Sinais mecânicos também interferem na orientação dos axônios. Mais especificamente, os diferentes níveis de rigidez do tecido por onde crescem. Segundo Kristian, “há diferentes gradientes de rigidez no tecido cerebral. Os neurônios evitam os locais mais rígidos e seguem em direção aos mais macios”.

COMO SE DEU A EXPERIÊNCIA

Como os cientistas chegaram a essa constatação? Observando o funcionamento de células ganglionares de rãs do gênero Xenopus in vitro – ou seja, em meios de cultura – e in vivo – inseridas no todo de um organismo.  Para que você compreenda melhor, estas células são, em resumo, neurônios localizados na retina que, ao unirem seus axônios, formam o nervo óptico, comunicando-se com o cérebro que recebe então as informações visuais. Quanto as rãs Xenopus, elas costumam ser mais utilizadas como modelos nesse tipo de pesquisa, porque os ovócitos dessa espécie são relativamente grandes e, por isso, mais facilmente manipuláveis em experimentos. Assim, utilizando duas linhagens idênticas de células ganglionares dessa espécie, variou-se apenas a rigidez do hidrogel utilizado como meio de cultura, observando-se então o crescimento delas. Percebeu-se que enquanto no meio mais rígido o crescimento dos axônios se dava de forma rápida e sempre em linhas retas, o contrário se dava no meio menos rígido, onde as ramificações se davam mais lentamente e em várias direções.


A segunda parte do experimento consistiu em observar se este fenômeno se repetia quando essas mesmas células encontravam-se inseridas num organismo. Para isto, os cientistas mediram partes diferentes do cérebro dos embriões de Xenopus a fim de checar se havia de fato gradações de rigidez, e se essas gradações exerciam a mesma influência no crescimento dos axônios observada nas células in vitro. Não somente confirmou-se essa hipótese, como ao reproduzir esses gradientes de rigidez nos substratos in vitro, constatou-se que não somente o crescimento se dava de forma diferenciada de acordo com os níveis de rigidez, como eram justamente essas gradações que orientavam esse crescimento.

INDO MAIS ALÉM NA PESQUISA

Os cientistas ainda puderam descobrir não somente os fatores que interferem no crescimento dos axônios, mas também COMO os axônios percebem esses fatores. Basicamente, trata-se da proteína PIEZO1, que atua como o sensor mecânico, o sentido do “tato” para os neurônios, que capta essas diferenças de rigidez no tecido cerebral. Nos animais que, por mutação gênica, não sintetizavam essa proteína, percebeu-se uma deficiência no desenvolvimento dos axônios, que não conseguiam chegar ao seu destino final.
E agora? Podemos dizer que AMANHÃ estas descobertas já estarão sendo empregadas na medicina? É óbvio que NÃO. A ciência não age por impulso, por paixão, por mero entusiasmo. Muito menos tira conclusões precipitadas. Ela entende que por trás de cada fenômeno, existem centenas de variáveis envolvidas, e cada uma delas precisa ser cuidadosamente eliminada até a conclusão “final”. Mas, como visto no próprio exemplo mostrado neste estudo, nem sempre um trajeto rápido e em linha reta implica num melhor resultado. A própria experiência agora se ramifica para outros gêneros animais além do Xenopus, e para outras células do tecido nervoso. É indiscutível que um passo importantíssimo já foi dado. Mas, nas palavras do próprio Kristian, “ainda há muito o que fazer”.[Diariodebiologia]

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Oleh

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