Encontrada no município de Niquelândia (GO), a Erythroxylum niquelandense é uma espécie inédita e, segundo pesquisador, poderia ser estudada por seus possíveis efeitos terapêuticos
Em meio a uma pesquisa de campo no Legado Verdes do Cerrado, única reserva particular de desenvolvimento sustentável da região Centro-Oeste, um vegetal saltou aos olhos do botânico Marcos José da Silva. Pouco mais de um minuto foi o suficiente para que o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) exclamasse, sem hesitar, ao colega que o acompanhava: “Estamos diante de uma nova espécie de Erythroxylum!”.
Análises laboratoriais subsequentes justificariam a suspeita categórica do pesquisador. Batizada em homenagem a Niquelândia, município goiano onde foi encontrada, a então desconhecida Erythroxylum niquelandense foi introduzida ao universo científico em artigo publicado recentemente no periódico Phytotaxa Magnolia Press.
Resultado de um projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG) em parceria com a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) e a empresa Reservas Votorantim, a descoberta se deu em uma área da reserva conhecida como Capão do Bandeira, localizada no norte do estado de Goiás. O vegetal foi encontrado sob solos argilosos ricos em serapilheira – camada de material orgânico ou em decomposição presente na superfície de florestas –, próximo ao riacho local.
Acima, estípulas (C), detalhe do caule e da casca (D), fascículo com botão de flor (E), frutos imaturos (F) e fruto em estágio avançado (G) da Erythroxylum niquelandense (Foto: M.J.Silva)
Integrante de um gênero popularmente conhecido como pimentinha-do-mato, a planta chamou a atenção de Silva por seu tamanho. Ao contrário de outras espécies Erythroxylum, o vegetal não passava de 1 metro e meio. Folhas grandes e porte de subarbusto também intrigaram o botânico, que pesquisa vegetação há quase uma década. “É uma espécie de pequeno porte que tem aproximadamente de 70 centímetros até 1,20 metro, diferente da maioria das espécies do grupo, que são árvores”, explica Silva a GALILEU.
Com ajuda de um estereomicroscópio, outro diferencial foi atribuído à Erythroxylum niquelandense: número elevado de inflorescências (10 a 15 flores) e frutos, estes redondos e avermelhados. Depois de revisar estudos sobre o gênero ao qual pertence o vegetal, pesquisadores do Departamento de Botânica da UFG atestaram que o achado representava uma espécie ainda não descrita.
Integrante de um gênero popularmente conhecido como pimentinha-do-mato, a planta chamou a atenção de Silva por seu tamanho. Ao contrário de outras espécies Erythroxylum, o vegetal não passava de 1 metro e meio. Folhas grandes e porte de subarbusto também intrigaram o botânico, que pesquisa vegetação há quase uma década. “É uma espécie de pequeno porte que tem aproximadamente de 70 centímetros até 1,20 metro, diferente da maioria das espécies do grupo, que são árvores”, explica Silva a GALILEU.
Com ajuda de um estereomicroscópio, outro diferencial foi atribuído à Erythroxylum niquelandense: número elevado de inflorescências (10 a 15 flores) e frutos, estes redondos e avermelhados. Depois de revisar estudos sobre o gênero ao qual pertence o vegetal, pesquisadores do Departamento de Botânica da UFG atestaram que o achado representava uma espécie ainda não descrita.
Nova espécie foi encontrada sob solos argilosos ricos em serapilheira na reserva Legado Verdes do Cerrado. Acima, habitat (A) e folhas (B) da planta (Foto: M.J.Silva)
Potencial fármaco
Mas, segundo Silva, a descoberta pode ir além da descrição de uma planta inédita. Isso porque, lembra o professor, espécies do gênero Erythroxylum costumam produzir substâncias com potencial terapêutico – especialmente no que diz respeito ao câncer. É o caso da Erythroxylum campestre, uma planta do Cerrado cujas folhas, segundo estudo da UFG, podem levar à redução de células tumorais do sarcoma 180 – ou “tumor de Crocker”, um tipo de rápida proliferação.
Estima-se que haja, só no Cerrado brasileiro, 130 espécies do gênero Erythroxylum – no mundo, elas são cerca de 250. Predominantes nas Américas, essas plantas começaram a despertar maior interesse no século 19, quando foram descobertas as propriedades anestésicas da cocaína, substância presente nas folhas da Erythroxylum coca. Atualmente, no entanto, Silva diz que o baixo número de estudos sobre a categoria evidencia que o gênero parece estar longe dos holofotes.
Segundo o botânico, a nova espécie descoberta pode ser a próxima do gênero a entrar para o rol de plantas com propriedades medicinais contra o câncer, mas experimentos em laboratório são necessários para elucidar a possibilidade. “Como plantas que fazem parte de um mesmo grupo geralmente têm uma ancestralidade compartilhada, nós inferimos que ela também possa ser usada para a mesma finalidade”, explica o professor.
Responder a essa incógnita, porém, não é o foco do projeto liderado por Silva. Em vigor desde 2009, a parceria público-privada entre FAPEG, CBA e Votorantim atende outro objetivo: esmiuçar a biodiversidade do Cerrado. A partir de análises em campo, pesquisadores de diferentes universidades públicas se dividem para caracterizar não só as plantas, mas também anfíbios, algas, aves e insetos da reserva Legado Verdes do Cerrado.
Se consideradas as taxas de destruição da savana brasileira, listar as espécies que povoam a região é especialmente importante, considera o botânico. Só em 2020, o Cerrado perdeu 734.010 mil hectares de vegetação nativa, o que significa um aumento de 13,7% em relação a 2019, segundo um relatório do consórcio Chain Reaction Research divulgado em março. “Estudos voltados para o inventário da vegetação se tornam cruciais, porque atualmente existem inúmeras reservas que são protegidas por lei e a maioria delas não sabe o patrimônio genético que detém”, opina o pesquisador.
Para Silva, um segundo fator também reforça a importância desse tipo de parceria. “Sabemos que o Brasil é um país com diferentes problemas políticos que fazem com que o financiamento público à pesquisa seja cada vez menor, então projetos assim são sempre bem-vindos”, afirma.
Potencial fármaco
Mas, segundo Silva, a descoberta pode ir além da descrição de uma planta inédita. Isso porque, lembra o professor, espécies do gênero Erythroxylum costumam produzir substâncias com potencial terapêutico – especialmente no que diz respeito ao câncer. É o caso da Erythroxylum campestre, uma planta do Cerrado cujas folhas, segundo estudo da UFG, podem levar à redução de células tumorais do sarcoma 180 – ou “tumor de Crocker”, um tipo de rápida proliferação.
Estima-se que haja, só no Cerrado brasileiro, 130 espécies do gênero Erythroxylum – no mundo, elas são cerca de 250. Predominantes nas Américas, essas plantas começaram a despertar maior interesse no século 19, quando foram descobertas as propriedades anestésicas da cocaína, substância presente nas folhas da Erythroxylum coca. Atualmente, no entanto, Silva diz que o baixo número de estudos sobre a categoria evidencia que o gênero parece estar longe dos holofotes.
Segundo o botânico, a nova espécie descoberta pode ser a próxima do gênero a entrar para o rol de plantas com propriedades medicinais contra o câncer, mas experimentos em laboratório são necessários para elucidar a possibilidade. “Como plantas que fazem parte de um mesmo grupo geralmente têm uma ancestralidade compartilhada, nós inferimos que ela também possa ser usada para a mesma finalidade”, explica o professor.
Responder a essa incógnita, porém, não é o foco do projeto liderado por Silva. Em vigor desde 2009, a parceria público-privada entre FAPEG, CBA e Votorantim atende outro objetivo: esmiuçar a biodiversidade do Cerrado. A partir de análises em campo, pesquisadores de diferentes universidades públicas se dividem para caracterizar não só as plantas, mas também anfíbios, algas, aves e insetos da reserva Legado Verdes do Cerrado.
Se consideradas as taxas de destruição da savana brasileira, listar as espécies que povoam a região é especialmente importante, considera o botânico. Só em 2020, o Cerrado perdeu 734.010 mil hectares de vegetação nativa, o que significa um aumento de 13,7% em relação a 2019, segundo um relatório do consórcio Chain Reaction Research divulgado em março. “Estudos voltados para o inventário da vegetação se tornam cruciais, porque atualmente existem inúmeras reservas que são protegidas por lei e a maioria delas não sabe o patrimônio genético que detém”, opina o pesquisador.
Para Silva, um segundo fator também reforça a importância desse tipo de parceria. “Sabemos que o Brasil é um país com diferentes problemas políticos que fazem com que o financiamento público à pesquisa seja cada vez menor, então projetos assim são sempre bem-vindos”, afirma.
Reprodução: Revista Galileu
Planta descoberta no Cerrado faz parte de gênero com potencial anticâncer
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Oleh
josé